Seguidores

domingo, 9 de novembro de 2008

Pablo Neruda.


Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.

há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.

Caminhos.


O degrau da escada não foi inventado para repousar, mas apenas para sustentar o pé o tempo necessário para que o homem coloque o outro pé um pouco mais alto.

Tuas roupas.



Tuas roupas no meu
guarda-roupa têm mais
intimidade do que os
nossos corpos na cama.

Uma certa fricção ou
fruição macia e fria
de corpos prostrados
um roce, uma prega
do tira e põe do cabide.

Lado a lado são vestes
nuas, tuas, cruas
com vestígios de
felicidade.

Talvez por contágio
proximidade
sofreguidão, ressábio
presságio e ausência.

Roupas despidas de ti
vazias, contidas
guardando as formas
de tua liberdade.

Um certo fetichismo
de abandono
resquícios de suor
e perfume, dobras
quem sabe manchas.

Visito tuas roupas
com as narinas
com os dedos
solitários.

Superfícies aveludadas
amarfanhadas, repassadas
revisitadas
meias e ceroulas
misturadas com sutiãs
e gravatas na gaveta
alicates, dedais
preservativos
em estado de inação
e promiscuidade.

Uma carência de botões
bolsos, beiradas
desejos encardidos
preteridos
postergados.


Poema de Antonio Miranda.

Velhos são os trapos. II

sábado, 8 de novembro de 2008

Velhos são os trapos.


Outrora, a velhice era uma dignidade; hoje, é um peso .

Caminhos.


Caminhante, não há caminho. Faz-se o caminho ao andar

Constância.


Ao pingar,a gota escava a pedra.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Livros.


Ler um livro é para o leitor conhecer a pessoa e o modo de pensar de alguém que lhe é estranho. É procurar compreendê-lo e, sempre que possível, fazer dele um amigo .

Exposição de Fotografia em Constância .


Palácio de Belém

De 10 a 14 e de 23 a 30 de Novembro o Cine-Teatro Municipal de Constância vai ter patente ao público a Exposição de Fotografia denominada Palácio de Belém.

A mostra será inaugurada na próxima segunda-feira, dia 10 de Novembro, pelas 15 horas, numa cerimónia que será presidida pelo Secretário-Geral da Presidência da República, Dr. Arnaldo Pereira Coutinho.

Com a dinamização da iniciativa a Câmara Municipal de Constância e o Museu da Presidência da República pretendem assinalar um dos mais importantes marcos históricos da História de Portugal do século XX, a Implantação da República a 5 de Outubro de 1910.

A exposição poderá ser visitada no seguinte horário: De 10 a 14 de Novembro das 9 às 12.30H; de 23 a 30 de Novembro: dia 23, das 15.00H às 21.00H; de segunda a quinta-feira, das 10.00H às 12.30H e das 14.00H às 19.00H; na sexta-feira, das 10.00H às 12.30H e das 14.00H às 21.00H; sábado das 14.00H às 21.30H; domingo, dia 30, das 14.00H às 19.00H.

Por CMC

A fome do primeiro grito.




Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
desejasse.

Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.

Te olhei. E há um tempo.
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta

Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.

Hilda Hilst.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Jornais.


Um jornal é um instrumento incapaz de discernir entre uma queda de bicicleta e o colapso da civilização .

Mar.



o mar sem fissuras

um mar sem vincos, estrias

um mar-amplidão

sem marcas, em movimento



mar a que tudo vai

mar adiante, mar amor

cemitério de tudo, que tudo

suga: mar em que deposito

dúvidas, dádivas, devaneios



mar mar mar em ondas

petrificadas, em versos mar

ginais = vaginas = ostras

ostra(cismo) do mar

mar-útero, mártir(io)



m a r



adentro

adentr

adent

aden

ade

ad

(m) a (r)



quando ao mar tudo vier

o mar será isso tudo

= mar sem margens

mar .

Poema de António Miranda.

Emprender.


Empreender é o pensamento seguido da atitude de fazer acontecer.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Champions.


73' - Golo do Sporting, por Derlei.
Após uma grande jogada de Izmailov, já no interior da área do Shakhtar, o avançado brasileiro dá um pequeno toque na bola antes de rematar de rematar de forma certeira no canto direito de Pyatov.

Força SCP,rumos aos oitavos.

Álcool.


O álcool não consola, não preenche os vazios psicológicos, mas supre a ausência de Deus. Não compensa o homem. Pelo contrário, anima a sua loucura, transporta-o a regiões supremas onde é mestre do seu próprio destino .

Os vendilhões do templo.




Deus disse: faz todo o bem
Neste mundo, e, se puderes,
Acode a toda a desgraça
E não faças a ninguém
Aquilo que tu não queres
Que, por mal, alguém te faça.

Fazer bem não é só dar
Pão aos que dele carecem
E à caridade o imploram,
É também aliviar
As mágoas dos que padecem,
Dos que sofrem, dos que choram.

E o mundo só pode ser
Menos mau, menos atroz,
Se conseguirmos fazer
Mais p'los outros que por nós.

Quem desmente, por exemplo,
Tudo o que Cristo ensinou.
São os vendilhões do templo
Que do templo ele expulsou.

E o povo nada conhece...
Obedece ao seu vigário,
Porque julga que obedece
A Cristo — o bom doutrinário.

António Aleixo, in "Este Livro que Vos Deixo..."

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Literatura.

José Manuel Saraiva.
Sinopse
1514. Na época áurea dos Descobrimentos Portugueses, D. Manuel I toma a decisão de enviar ao Papa Leão X uma grande embaixada, demonstração viva do seu poderio temporal. D. Diogo Pacheco, fidalgo da corte, amigo pessoal do Rei Venturoso, é encarregado pelo monarca de compor e proferir a Oração de Obediência ao Sumo Pontífice, o momento alto da embaixada.
A comitiva parte de Lisboa em cinco embarcações com um tesouro valiosíssimo e animais exóticos trazidos de África e da Índia. Após conturbada viagem o cortejo chega a Roma, onde o Papa preparara uma sumptuosa recepção com a presença das mais altas figuras profanas e religiosas da época.
No meio do fausto da corte portuguesa e da Cúria dos Medici, contrastante com a dor e a miséria do povo sofredor, ascende à figura de símbolo o amor regenerador de D. Diogo pela bela judia, Raquel Aboab, a quem aquele salvara da fogueira e da sanha intolerante do antijudaísmo reinante.
A época de ouro da história do mundo esconde segredos e pecados inconfessáveis das grandes figuras que comandam os destinos do mundo. Entre a fé e a cegueira do poder, a aparência e a essência da condição humana, o sentido de missão e a vaidade só o amor poderá ser redentor. Aos olhos de Deus as personalidades da história não ficarão impunes. E Deus não jogará aos dados.

Oh gente da minha terra.



Marisa.

Eu nunca guardei rebanhos.



Eu nunca guardei rebanhos,
Mas é como se os guardasse.
Minha alma é como um pastor,
Conhece o vento e o sol
E anda pela mão das Estações
A seguir e a olhar.
Toda a paz da Natureza sem gente
Vem sentar-se a meu lado.
Mas eu fico triste como um pôr de sol
Para a nossa imaginação,
Quando esfria no fundo da planície
E se sente a noite entrada
Como uma borboleta pela janela.
Mas a minha tristeza é sossego
Porque é natural e justa
E é o que deve estar na alma
Quando já pensa que existe
E as mãos colhem flores sem ela dar por isso.

Como um ruído de chocalhos
Para além da curva da estrada,
Os meus pensamentos são contentes.
Só tenho pena de saber que eles são contentes,
Porque, se o não soubesse,
Em vez de serem contentes e tristes,
Seriam alegres e contentes.

Pensar incomoda como andar à chuva
Quando o vento cresce e parece que chove mais.

Não tenho ambições nem desejos
Ser poeta não é uma ambição minha
É a minha maneira de estar sozinho.

E se desejo às vezes
Por imaginar, ser cordeirinho
(Ou ser o rebanho todo
Para andar espalhado por toda a encosta
A ser muita cousa feliz ao mesmo tempo),

É só porque sinto o que escrevo ao pôr do sol,
Ou quando uma nuvem passa a mão por cima da luz
E corre um silêncio pela erva fora.

Quando me sento a escrever versos
Ou, passeando pelos caminhos ou pelos atalhos,
Escrevo versos num papel que está no meu pensamento,
Sinto um cajado nas mãos
E vejo um recorte de mim
No cimo dum outeiro,
Olhando para o meu rebanho e vendo as minhas idéias,
Ou olhando para as minhas idéias e vendo o meu rebanho,
E sorrindo vagamente como quem não compreende o que se diz
E quer fingir que compreende.

Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predileta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer cousa natural —
Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado.

Alberto Caeiro.

Garrett.


Há três espécies de mulheres neste mundo:A mulher que se admira,a mulher que se deseja,e a mulher que se ama.
A beleza,o espírito,a graça,os dotes da alma e do corpo geram admiração.
Certas formas,certo ar voluptoso criam o desejo.
O que produz o amor não se sabe;é tudo isto ás vezes;é mais do que isto;não é nada disto.
Não sei o que é;mas sei que se pode admirar uma mulher sem a desejar,que se pode desejar sem a amar.

Almeida Garrett, in viagens na minha terra.