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quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Carta de Amor.


Eu sabia que seria apenas depois de te teres ido embora que iria perceber a completa extensão da minha felicidade e, alas! o grau da minha perda também. Ainda não a consegui ultrapassar, e se não tivesse à minha frente aquela caixinha pequena com a tua doce fotografia, pensaria que tudo não teria passado de um sonho do qual não quereria acordar. Contudo os meus amigos dizem que é verdade, e eu próprio consigo-me lembrar de detalhes ainda mais charmosos, ainda mais misteriosamente encantadores do que qualquer fantasia sonhadora poderia criar. Tem que ser verdade. Martha é minha, a rapariga doce da qual todos falam com admiração, que apesar de toda a minha resistência cativou o meu coração logo no primeiro encontro, a rapariga que eu receava cortejar e que veio para mim com elevada confiança, que fortaleceu a minha confiança em mim próprio e me deu esperanças e energia para trabalhar, na altura que eu mais precisava.

Quando tu voltares, querida rapariga, já terei vencido a timidez e estranheza que até agora me inibiu perante a tua presença. Iremos sentar-nos de novo sozinhos naquele pequeno quarto agradável, vais-te sentar naquela poltrona castanha , eu estarei a teus pés no banquinho redondo, e falaremos do tempo em que não existirá diferença entre noite e dia, onde não existirão intrusos nem despedidas, nem preocupações que nos separem.

A tua amorosa fotografia. No início, quando eu tinha o original à minha frente não pensei nada sobre a mesma; mas agora, quanto mais olho para ela mais esta se assemelha ao objecto amado; espero que o rosto pálido se transforme na cor das nossas rosas, e que os braços delicados se desprendam da superfície e prendam a minha mão; mas a imagem preciosa não se move, parece apenas dizer: «Paciência! Paciência” Eu sou apenas um símbolo, uma sombra no papel; a tua amada irá voltar, e depois podes negligenciar-me de novo».

Eu gostaria imenso de colocar esta fotografia entre os deuses da minha casa que pairam acima da minha secretária, mas embora eu possa mostrar os rostos severos dos homens que reverencio, quero esconder a face delicada da minha amada só para mim. Vai continuar na tua pequena caixinha e eu não me atrevo a confessar a quantidade de vezes, nestas últimas vinte e quatro horas, que tranquei a minha porta para poder tirar a fotografia da caixa e refrescar a minha memória.

Carta de Sigmund Freud a Martha Bernays, 19 de Junho 1882 (excerto)

16 comentários:

ValeriaC disse...

Fascinante conhecer um pouquinho deste lado apaixonado de Freud...eu que só o conheci dos meus tempos de faculdade de Psicologia, como "pai da psicanálise"...
É... parece que a magia do amor, nem Freud explica...
Beijinhos...
Valéria

Élys disse...

Uma bela carta de amor e saudade.
Um abraço.

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido Manuel

Adorei este texto e não conhecia este lado de Freud.

Deixo um beijinho
Sonhadora

Viviana disse...

Meu caro Manuel

Lendo com olhos de ler...e, refletindo sobre o lido...é mesmo Freud.

Um abraço
viviana

malu.machadojf@gmail.com disse...

Ah este amor de idolatria tão típico dessa época. Hoje as mulheres ficariam com medo de um homem que quer guardar sua beleza só para ele. Como o mundo mudou não?

Adorei conhecer um pouquinho de Freud. Obrigada!

Abs,

Lúcia Bezerra de Paiva disse...

Será que hoje Freud escreveria uma carta assim?
Que doçura!
Não conhecia, essa face freudiana.
Beijos,
da Lúcia

Anónimo disse...

André Agui.
Gostei, senti autenticidade muito boa no ar. coisa novas lá na rua 9. abraços

http://blogdarua9.blogspot.com/

Gilmara Wolkartt disse...

Uma foto pode levar a mil reflexões.Esse texto de Freud é muito bonito.
Gdbeijo

Yasmine Lemos disse...

Será que Freud tinha as nossas neuras? cartas de amor, são covardia a alma.
beijos

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
MA FERREIRA disse...

Seu post ficou ainda mais interessante quanfo vc colocou o autor do poema.
Não sabia deste lado romantico de
Freud!!

bj

Socorro Melo disse...

Olá, Manuel!

Uma bela carta de amor! E quando o amor surge em nossas vidas, nos nivela. Todos pensamos e agimos com o coração.
Espero que essa história tenha dado frutos bonitos.

Um abraço
Socorro Melo

De Salto Alto disse...

O Salto Alto está nascendo, conto com sua visita e comentarios.
Bjos no coração.

Anónimo disse...

Venho desejar-te um bom fim de semana e agradecer-te com muito carinho a tua presença sempre amiga no meu blog.
Gostei de ler esta tua postagem, nunca tinha lido e me agradou.

Beijinho, fica bem

natalia nuno

preciosa disse...

Muitas vezes uma carta consegue ser ouvida muito mais do que um grito de amor!
Agradeço o carinho de sua visita e comentário
Que seu final de semana seja regado de muito amor
Preciosa maria

Regina Rozenbaum disse...

Boa garimpada essa!
Beijuuss, poeta, n.a.