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domingo, 3 de abril de 2011
A Primeira Palavra que em Toda a Minha Vida me Esgotou o Ser
Uma palavra. Disse-a. Amo-te - uma palavra breve. Quantos milhões de palavras eu disse durante a vida. E ouvi. E pensei. Tudo se desfez. Palavras sem inteira significação em si, o professor devia ter razão. Palavras que remetiam umas para as outras e se encostavam umas às outras para se aguentarem na sua rede aérea de sons. Mas houve uma palavra - meu Deus. Uma palavra que eu disse e repercutiu em ti, palavra cheia, quente de sangue, palavra vinda das vísceras, da minha vida inteira, do universo que nela se conglomerava, palavra total. Todas as outras palavras estavam a mais e dispensavam-se e eram uma articulação ridícula de sons e mobilizavam apenas a parte mecânica de mim, a parte frágil e vã. Palavra absoluta no entendimento profundo do meu olhar no teu, palavra infinita como o verbo divino. Recordo-a agora - onde está? Como se desfez? Ou não desfez mas se alterou e resfriou e absorveu apenas a fracção de mim onde estava a ternura triste, o conforto humilde, a compaixão. Não haverá então uma palavra que perdure e me exprima todo para a vida inteira? E não deixe de mim um recanto oculto que não venha à sua chamada e vibre nela desde os mais finos filamentos de si? Uma palavra. Recupero-a agora na minha imaginação doente. Amo-te. Na intimidade exclusiva e ciumenta do nosso olhar mútuo e encantado. Fecha-nos o lençol na claridade difusa do amanhecer, estás perto de mim no intocável da tua doçura. Frágil de névoa. Fímbria de sorriso e de receio, de pavor, no meu olhar embevecido. Uma palavra. A primeira que em toda a minha vida me esgotou o ser. A que foi tão completa e absorvente, que tudo o mais foi um excesso na criação. Deus esgotou em mim, na minha boca, todo o prodígio do seu poder. Ao princípio era a palavra. Eu a soube. E nada mais houve depois dela.
Vergílio Ferreira, in 'Para Sempre'
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13 comentários:
Manuel um lindo Domingo pra vc!!
beeeijos.
Hoje descobri que não só as Cartas de Neruda não são ridículas. Obrigada.
De repente, as palavras de "Para Sempre" fizeram-me pensar que tenho de voltar a ler, com urgência, este livro.
Obrigada.
Bom Domingo.
Beijo
A palavra e sua força, sempe.
Abraços!
De Neruda a Vergílio impera o AMOR...para sempre!
Beijuuss, amado, n.a.
Dá pra sentir realmente quando se lê a intensidade desse texto! Esgota a quem de ouve, mais preenche a quem se lê, abraços!
LER E RELER POST TUO,MON AMIE ESCRIBA,É CONTUNDENTEMENTE , SE REFAZER IN PERSONA!MERCI MONSIEUER!
VIVA LA VIE
Dizer Eu te amo e sempre muito perigoso, e nao poder voltar atras, e
mergulhar no fundo de um oceano escuro...melhor refletir...bem melhor, se ainda der tempo...se ainda for tempo...
Bom dia!
Um texto de poeta e lindo, muito lindo mesmo. Uma excelente escolha amigo.
Bom domingo.
beijos
Neruda sempre Neruda...
bom domigo pra ti também amiga poeta
bj
lu
Eis a força da pequena frae " Eu te amo".
O amor deve ser sempre lindo.
Meu querido Manuel
Um texto muito intenso e profundo de Vergílio Ferreira...o amor sempre.
Adorei e deixo um beijinho
Sonhadora
Manuel, meu querido amigo
Quanta sensibilidade tiveste para selecionar este texto encantador e dividì-lo conosco!
Uma lindeza, para ser lida e relida muitas vezes...
Muito, muito grata!
Forte abraço.
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