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domingo, 28 de março de 2010

A Profundidade do Ser.




E de vez em quando descer à gravidade de mim, à profundidade do meu ser. E verificar então que tudo se transfigura. Que é que significa este garatujar quase gratuito, este riso superficial, todo este modo de ser menor? A melancolia profunda, tão de dentro que ela se iguala à alegria sem medida. Espaço rarefeito de nós, é o lugar da grandeza do homem, do que é nele fundamental, o lugar do aparecimento de Deus. Mas Deus não me aparece - aparece apenas a inundação que me vem da infinita beatitude, da grandeza e do assombro. Nós vivemos habitualmente à superfície de nós, ligados ao que é da vida imediata, enredados nas mil futilidades com que se nos enchem os dias. Mas de vez em quando, o abismo da natureza, um livro ou uma música que dos abismos vem, abre-nos aos pés um precipício hiante e tudo se dilui num sentir que está antes e abaixo e mais longe que esse tudo. Há uma harmonia que em nós espera por um som, um acorde, uma palavra, para imediatamente se organizar e envolver-nos. E aí somos verdade para a infinidade dos séculos.

Vergílio Ferreira, in 'Conta-Corrente 3'

4 comentários:

Denise disse...

"O homem que não tem vida interior é escravo de seus arredores" (Henri F. Amiel)

Beijos

Manuela Freitas disse...

Caro Manuel,
Ele é só um dos meus escritores preferidos, mas é arrasador, pela forma como escreve e motiva que mergulhemos profundamente em nós!...
Beijinhos,
Manuela

Silenciosamente ouvindo... disse...

Vergilio Ferreira sabia bem o que
escrevia.Um escritor fantástico.
Bj. e espero tenha passado um
bom domingo./Irene

angela disse...

Que texto mais lindo!
Adorei.
Boa semana, amigo
beijos