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sexta-feira, 17 de julho de 2009

Partir.


Quantas vezes descobri onde deveria ir, apenas por partir para um outro lugar ...

quinta-feira, 16 de julho de 2009


Tentação .



Eu não resistirei à tentação,
não quero que de mim possas perder-te,
que só na fonte fria da razão
renasça a minha sede de beber-te.

Eu não resistirei à tentação
de quanto adivinhei nesta amargura:
um sim que só assalta quem diz não,
um corpo que entrevi na selva escura.

Resistirei a te chamar paixão,
a te perder nos versos, nas palavras:
mas não resistirei à tentação
de te dizer que o céu é o que rasa

a luz que nos teus olhos eu perdi
e que na terra toda não mais vi.

Luis Filipe Castro Mendes, in "Os Amantes Obscuros"

Ser Diferente.



A única salvação do que é diferente é ser diferente até o fim, com todo o valor, todo o vigor e toda a rija impassibilidade; tomar as atitudes que ninguém toma e usar os meios de que ninguém usa; não ceder a pressões, nem aos afagos, nem às ternuras, nem aos rancores; ser ele; não quebrar as leis eternas, as não-escritas, ante a lei passageira ou os caprichos do momento; no fim de todas as batalhas — batalhas para os outros, não para ele, que as percebe — há-de provocar o respeito e dominar as lembranças; teve a coragem de ser cão entre as ovelhas; nunca baliu; e elas um dia hão-de reconhecer que foi ele o mais forte e as soube em qualquer tempo defender dos ataques dos lobos.

Agostinho da Silva, in 'Diário de Alcestes'

Jardins Proibidos



[Em especial para a minha querida amiga Fátima.]

quarta-feira, 15 de julho de 2009

A Idade não nos Torna mais Sábios



As pessoas imaginam que precisamos de chegar a velhos para ficarmos sábios, mas, na verdade, à medida que os anos avançam, é difícil mantermo-nos tão sábios como éramos. De facto, o homem torna-se um ser distinto em diferentes etapas da vida. Mas ele não pode dizer que se tornou melhor, e, em alguns aspectos, é igualmente provável que ele esteja certo aos vinte ou aos sessenta. Vemos o mundo de um modo a partir da planície, de outro a partir do topo de uma escarpa, e de outro ainda dos flancos de uma cordilheira. De alguns desses pontos podemos ver uma porção maior do mundo que de outros, mas isso é tudo. Não se pode dizer que vemos de modo mais verdadeiro de um desses pontos que dos restantes.

Johann Wolfgang von Goethe,

Desejo Indomável




Como corre a gazela
pela sombra dos bosques,
enlouquecida pelo próprio perfume,
assim corro eu, enlouquecido,
nesta noite do coração de maio
aquecida pela brisa do Sul.

Perdi o caminho
e erro ao acaso.
Quero o que não tenho,
e tenho o que não quero.

A imagem do meu próprio desejo
sai do meu coração
e, dançando diante de mim,
cintila uma e outra vez,
subitamente.

Quero agarrá-la, mas escapa-se.
E, já longe, chama-me outra vez
do atalho ...
Quero o que não tenho
e tenho o que não quero.

Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera"

Juntos.


Para estar junto não é preciso estar perto, mas sim do lado de dentro.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Do livro :O vencedor está só.


A gaivota voava por cima de uma praia no Golfo,quando viu um rato.Desceu dos céus e perguntou ao roedor:
-Onde estão as tuas asas ?
Cada bicho fala um idioma,o rato não percebeu o que ele disse;mas reparou que o animal que estava á sua frente tinha duas coisas estranhas e grandes a sair do corpo.
'Deve sofrer de alguma doença'pensou o rato.
A gaivota percebeu que o rato olhava fixamente para as suas asas:
-Pobrezinho,foi atacado por monstros que o deixaram surdo e lhe roubaram as asas.
Compadecida,pegou-lhe com o bico e levou-o a passear nas alturas.'Pelo menos mata saudades',pensava,enquanto voavam.
Depois com todo o cuidado,posou-o no chão.
O rato,durante alguns meses,tornou-se uma criatura profundamente infeliz;tinha conhecido as alturas,viu um mundo vasto e belo.
Mas, com o passar do tempo,acabou por se habituar novamente a ser rato e achou que o milagre que tinha acontecido na sua vida não psava de um sonho.

Paulo Coelho.

Coisas diferentes.


Amor e desejo são coisas diferentes. Nem tudo o que se ama se deseja e nem tudo o que se deseja se ama .

Se um Dia a Juventude Voltasse ...




se um dia a juventude voltasse
na pele das serpentes atravessaria toda a memória
com a língua em teus cabelos dormiria no sossego
da noite transformada em pássaro de lume cortante
como a navalha de vidro que nos sinaliza a vida

sulcaria com as unhas o medo de te perder... eu
veleiro sem madrugadas nem promessas nem riqueza
apenas um vazio sem dimensão nas algibeiras
porque só aquele que nada possui e tudo partilhou
pode devassar a noite doutros corpos inocentes
sem se ferir no esplendor breve do amor

depois... mudaria de nome de casa de cidade de rio
de noite visitaria amigos que pouco dormem e têm gatos
mas aconteça o que tem de acontecer
não estou triste não tenho projectos nem ambições
guardo a fera que segrega a insónia e solta os ventos
espalho a saliva das visões pela demorada noite
onde deambula a melancolia lunar do corpo

mas se a juventude viesse novamente do fundo de mim
com suas raízes de escamas em forma de coração
e me chegasse à boca a sombra do rosto esquecido
pegaria sem hesitações no leme do frágil barco... eu
humilde e cansado piloto
que só de te sonhar me morro de aflição

Al Berto, in 'Rumor dos Fogos'

segunda-feira, 13 de julho de 2009

O Inconveniente da Razão



O filósofo Pírron, encontrando-se num barco num dia de grande tormenta, mostrava aos que via mais apavorados ao seu redor um porquinho que lá estava, nem um pouco preocupado com aquela tempestade, e encorajava-os com o seu exemplo. Ousaremos dizer então que esse privilégio da razão, que tanto celebramos e por causa do qual nos consideramos donos e imperadores do restante das criaturas, tenha sido colocado em nós para tormento nosso? De que adianta o conhecimento das coisas se com isso perdemos o repouso e a tranquilidade que sem ele teríamos, e se nos torna de condição pior do que o porquinho de Pírron? A inteligência que nos foi dada para nosso maior bem, empregá-la-emos para nossa ruína, lutando contra o desígnio da natureza e contra a ordem universal das coisas, que indica que cada qual use os seus instrumentos e meios para benefício próprio?

Michel de Montaigne, in 'Ensaios'

Livro do Amor




O mais singular livro dos livros
É o Livro do Amor;
Li-o com toda a atenção:
Poucas folhas de alegrias,
De dores cadernos inteiros.
Apartamento faz uma secção.
Reencontro! um breve capítulo,
Fragmentário. Volumes de mágoas
Alongados de comentários,
Infinitos, sem medida.
Ó Nisami! — mas no fim
Achaste o justo caminho;
O insolúvel, quem o resolve?
Os amantes que tornam a encontrar-se.

Johann Wolfgang von Goethe, in "Divã Ocidental-Oriental"

Caminhar.


"O homem requer sempre uma inatingível meta, uma esperança vã, um descontentamento, que o incite a caminhar para a frente. "

domingo, 12 de julho de 2009

Da condição humana.



Todos sofremos.
O mesmo ferro oculto
Nos rasga e nos estilhaça a carne exposta
O mesmo sal nos queima os olhos vivos.
Em todos dorme
A humanidade que nos foi imposta.
Onde nos encontramos, divergimos.
É por sermos iguais que nos esquecemos
Que foi do mesmo sangue,
Que foi do mesmo ventre que surgimos.

Ary dos Santos, in 'Liturgia do Sangue'

Carícias.


As carícias são tão necessárias para a vida dos sentimentos como as folhas para as árvores. Sem elas, o amor morre pela raiz ...

Escolhas.


Liberdade não é poder escolher entre preto e branco mas sim abominar este tipo de propostas de escolha .

sábado, 11 de julho de 2009

Alguma mágoa..







Vinha trazendo no coração uma mágoa antiga que só fazia doer. Não sabia o que fazer com ela. E como apertava... E como doía... Ficava ela ali no canto esquerdo, bem quieta. Dava os ares de sua graça nas horas mais impensáveis. E como manchava... E como mexia... Pulava no peito como bola desgovernada que desce a ladeira sem olhar para os lados. Queria esquecê-la. Queria traí-la. Trancá-la lá fora sem pena da chuva. Deixando-a molhar como pano de porta, que sem borda aos poucos se encharca. Queria poder juntá-la com as mãos e com desespero de marujo perdido, arrancá-la para fora do barco. Deixá-la à deriva em companhia das ondas. Ela que se salvasse. Que se afogasse lentamente na imensidão fria dos mares. De longe eu acenaria em meu iate invencível, lamentando por não ter feito isso há mais tempo. Feliz por ter extirpado todo o tumor. Chegaria em casa tranqüila, talvez cansada da viagem. Tomaria uma Novalgina e iria cheia de graça pra cama. Sonharia com cores impossíveis e palavras ainda perdidas. Acordaria plena. Descansada. Completamente feliz. Escreveria meus versos roubados do invisível e ouviria os sons capturados do mundo. Prosseguiria vivendo a procura do irreal e do permitido. E seria feliz se não fosse a falta que se alojaria no peito clamando pela mágoa uma vez perdida, a reclamar junto com a lua sua ausência.

Alice Venturi.

Admirar !


Amar é admirar com o coração; admirar é amar com o espírito .

Amo-te Sempre .




Amo-te sempre
com um pouco de barco e de vento
com uma humildade de mar à tua volta
dentro do meu corpo; com o desespero
de ser tempo;

com um pouco de sol e uma fonte
adormecida na ternura.

Merecer este minuto de palavras habitando
o que há sem fim no teu retrato;
Este mesmo minuto em que chegam e partem navios
- nesta mesma cidade deste
minuto, desta língua, deste
romance diário dos teus olhos -

(e chegarão com armas? refugiados? trigo?
partirão com noivas? missionários? guerras? discursos?)

Merecer a densa beleza do teu corpo
que tem água e ternura, células, penumbra,
que dormiu no berço, dormiu na memória,
que teve soluços, febre, e absurdos desejos
maiores que os braços,

merecer os dias subindo das florestas - e vêm
banhar-se, lentos, nos teus olhos...

Merecer a Igreja, o ajoelhar das palavras,
entre estes cinemas visitando, em duas horas, a alma,
estes eléctricos parando atrás do infinito
para subirem os namorados, a viúva, o cobrador da luz, a
costureira
entre estes homens que ganham dinheiro, sangue frio, ou vícios,
ou medalhas
e estes telefones roubando a lealdade dos olhos...

Teus cabelos cheirarão ainda a infância
e a vento, depois de passarem por esta fome pública,
estes olhos com regras de trânsito, estes dias sujos,
estes lábios que já não ensinam o pomar
ou a fonte, nem têm gosto de leite e de aurora,
depois destes olhos cheios da pergunta de estarem vivos
em vão?

Merecer honradamente este poema, todos os poemas,
como quem parte, entre os dedos a brancura
quente de um pão!

Vítor Matos e Sá, in 'Esparsos'

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Alegria.


O homem hoje, para ser salvo, só tem necessidade de uma coisa: abrir o coração à alegria ...