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sábado, 19 de dezembro de 2009

A Poesia.




A poesia não se inventou para cantar o amor — que de resto não existia ainda quando os primeiros homens cantaram. Ela nasceu com a necessidade de celebrar magnificamente os deuses, e de conservar na memória, pela sedução do ritmo, as leis da tribo. A adoração ou captação da divindade e a estabilidade social, eram então os dois altos e únicos cuidados humanos: — e a poesia tendeu sempre, e tenderá constantemente a resumir, nos conceitos mais puros, mais belos e mais concisos, as ideias que estão interessando e conduzindo os homens. Se a grande preocupação do nosso tempo fosse o amor — ainda admitiríamos que se arquivasse, por meio das artes da imprensa, cada suspiro de cada Francesca. Mas o amor é um sentimento extremamente raro entre as raças velhas e enfraquecidas. Os Romeus, as Julietas (para citar só este casal clássico) já não se repetem nem são quase possíveis nas nossas democracias, saturadas de cultura, torturadas pela ansia do bem-estar, cépticas, portanto egoístas, e movidas pelo vapor e pela electricidade. Mesmo nos crimes de amor, em que parece reviver, com a sua força primitiva e dominante, a paixão das raças novas, se descobrem logo factores lamentavelmente alheios ao amor, sendo os dois principais aqueles que mais caracterizam o nosso tempo: o interesse e a vaidade. Nestas condições, o amor que voltou a ser, como na Grécia, um Cupido pequenino e brincalhão, que esvoaça, surripiando aqui e além um prazer fugitivo — é removido para entre os cuidados subalternos do homem, muito para baixo do dinheiro, muito para baixo da política... É uma ocupação, sem malícia o digo, que se deixa para quando acabar o dia verdadeiro e útil, e com ele os negócios, as ideias, os interesses que prendem. «Já não há hoje nada de produtivo a fazer? Já não há nada de sério em que pensar?... Bem! Então, um pouco de perfume nas mãos, e abra-se a porta ao amor que espera!» A isto está reduzida a Vénus fatal e vencedora!
Ora quando uma arte teima em exprimir unicamente um sentimento que se tornou secundário nas preocupações do homem — ela própria se torna secundária, pouco atendida e perde a pouco e pouco a simpatia das inteligências. Por isso hoje, tão tenazmente, os editores se recusam a editar, e os leitores se recusam a ler, versos em que só se cante de amor e de rosas. E o artista que não quer ser uma voz clamando no deserto e um papel apodrecendo no armazém, começa a evitar o amor como tema essencial da sua obra.

Eça de Queirós, in 'A Correspondência de Fradique Mendes'

5 comentários:

r disse...

Amiguinho,
este textinho que nos citou, acabou de operar (em mim) a reconciliaçãozinha com Eça. Há lugares capazes de nos reconciliarem, até ao momento, não sabia que os escritos, nao só, mas também. Lerei...inteiramente.
Obridada e beijinhos muitíssimos grandinhos para si.
R

Unknown disse...

Que amável minha querida amiguinha, então por hoje Jinhos XXL.
Bom fim de semana.

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Manuel
Belo texto sobre Eça.
Foi sempre polémico.
Beijinhos

Glorinha L de Lion disse...

Como já te disse antes, amo Eça...é um dos meus mais queridos escritores...ele será atual até o fim dos tempos...felizmente por um lado, infelizmente por outro....pois isso significa que os homens continuarão a fazer as mesmas besteiras pela eternidade afora...
Beijos.

AFRICA EM POESIA disse...

MANUEL
Feliz Natal
Tudo de bom para ti...



CINCO LETRAS



Cinco letras apenas
Todas juntas
Formam o Natal...
Natal meu...
Natal teu...
Natal de todos nós...
E neste Natal...

Queremos diferente...
De mãos postas...
Ao Menino Jesus...
Peço que dê...
Mais Paz...
Mais Amor...
Mais Carinho...

E que muitos mais meninos
Tenham um lar...
E nós...
Meninos crescidos...
Continuamos a fazer...
Para que todas as crianças...
Tenham casa, cama e pão.

LILI LARANJO