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terça-feira, 10 de março de 2009

O açougueiro






Era dia de faxina na casa de Zulmira quando o toque insistente do telefone a fez descer do alto da escada onde limpava uma prateleira.

— Desculpe-me a ousadia... — foi o que logo ouviu de uma voz galante. — Há tempos venho ensaiando para te ligar...

O coração começa a bater descompassado. Quem diria? Alguém a notara por aí! E pensar que o marido nem chegou a perceber que pintara o cabelo de vermelho...

— Eu quero marcar um encontro com você...

Ao ouvir a proposta, Zulmira enrubesceu. O coração parecia querer pular fora de seu peito. E agora? O que dizer?

— E então? — insistiu a voz.

— Eu... eu... não posso... — gaguejou. Quem seria este homem? Aquele vizinho novo que vivia às voltas com um poodle? Não! Ele parecia ter um jeito meio afetado. Deus meu!, seria o Odorico? O açougueiro? Bem que percebera que ultimamente ele sempre lhe escolhia a melhor peça...

— Eu sei que você é uma mulher casada... eu entendo... mas é apenas um encontro...

— Não, eu não posso! — repetiu com firmeza. Afinal de contas tinha lá os seus princípios, e ainda por cima dois filhos adolescentes. E se fosse mesmo o Odorico? Ah! O Odorico sim valia a pena. Um homem que mexia com a carne daquele jeito, o que é que não faria com uma mulher?

— Ninguém ficará sabendo... eu prometo! — continuou ele, persuasivo. – E tenho certeza que será uma noite inesquecível... Começaremos com um jantar à beira-mar... Depois iremos navegar durante a madrugada...

Zulmira deixava-se levar pela imaginação quando foi surpreendida por uma pergunta:

— Você gosta de ostras?

— Ostras? — repetiu, sem saber o que responder. Nunca comera ostras em toda sua vida, mas lera numa revista da cabeleireira que ostras eram afrodisíacas.

— Se você não gosta eu...

— Não! Imagine... gosto sim! — exclamou.

— Eu posso esperá-la amanhã à noite? — perguntou–lhe o homem. — Estou bastante ansioso para encontrá-la.

E agora? Deixaria a vida passar sem lutar por algumas boas lembranças? Este pensamento fora suficiente para convencê-la.

— Sim! — respondeu decidida. — Onde podemos nos encontrar?

— Faz o seguinte Telma: às 8:30 você me liga...

— Ei! Peraí! Meu nome não é Telma!

— Não?!! — exclamou o homem, aturdido.

— Não! — confirmou Zulmira, com a voz zangada.

— Mil perdões! — disse ele e desligou envergonhado num baque rápido.

E sem mais nada por esperar daquela tarde, Zulmira continuou a espanar a prateleira, pensando, de quando em quando, num longo suspiro, que a vida é assim mesmo.

Adriana Costalunga.

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