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terça-feira, 31 de março de 2009

Poema anónimo.



Vais até à nudez estreme dos sentidos
e nem vês que apagas o azul
desta água entardecida
entre a exacta ave circular
e a carne viva das palavras
que fluem da página dorida.

E o círculo da ave
é tão interior
na alegria da luz
que a albufeira retém o silêncio solar
até que se esgote o policrómico rumor
do poema que estás a desfiar.

Mas nenhuma água é tão perfeita e livre,
tão povoada de voos azuis,
tão compacta de sons incandescentes
como a que ressuma na obscuridade
onde os meus olhos se recolhem
de súbito inexistentes.

É que rente à ferida feliz
que é todo o meu corpo
está o lume do deslumbramento mais atroz
que fere talvez irremediavelmente
se eu não conseguir por algum tempo
receber apenas a tua voz.


(Poeta anónimo, in "Immoderato Instabile"

1 comentário:

Efigênia Coutinho ( Mallemont ) disse...

Manuel Marques, não poderia ir-me sem comentar a beleza destes versos, onde estes versos, burilados com metáforas em que a significação natural de uma palavra é substituída por outra, por virtude de relação de contigüidade, para quem as lê, depende sempre de vários fatores culturais do observador-leitor, principalmente do e no meio em que ele vive.

ADOREI,
Efigênia Coutinho