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sábado, 20 de fevereiro de 2010

Recordam-se Vocês do Bom Tempo d'Outrora !





Recordam-se vocês do bom tempo d'outrora,
Dum tempo que passou e que não volta mais,
Quando íamos a rir pela existência fora
Alegres como em Junho os bandos dos pardais?
C'roava-nos a fronte um diadema d'aurora,
E o nosso coração vestido de esplendor
Era um divino Abril radiante, onde as abelhas
Vinham sugar o mel na balsâmina em flor.
Que doiradas canções nossas bocas vermelhas
Não lançaram então perdidas pelo ar!...
Mil quimeras de glória e mil sonhos dispersos,
Canções feitas sem versos,
E que nós nunca mais havemos de cantar!
Nunca mais! nunca mais! Os sonhos e as esp'ranças
São áureos colibris das regiões da alvorada,
Que buscam para ninho os peitos das crianças.
E quando a neve cai já sobre a nossa estrada,
E quando o Inverno chega à nossa alma,então
Os pobres colibris, coitados, sentem frio,
E deixam-nos a nós o coração vazio,
Para fazer o ninho em outro coração.
Meus amigos, a vida é um Sol que chega ao cúmulo
Quando cantam em nós essas canções celestes;
A sua aurora é o berço, e o seu ocaso é o túmulo
Ergue-se entre os rosais e expira entre os ciprestes.
Por isso, quando o Sol da vida já declina,
Mostrando-nos ao longe as sombras do poente,
É-nos doce parar na encosta da colina
E volver para trás o nosso olhar plangente,
Para trás, para trás, para os tempos remotos
Tão cheios de canções, tão cheios de embriaguez,
Porque, ai! a juventude é como a flor do lótus,
Que em cem anos floresce apenas uma vez.

E como o noivo triste a quem morreu a amante,
E que ao sepulcro vai com suas mãos piedosas
Sobre um amor eterno — o amor dum só instante —
Deixar uma saudade e uma c'roa de rosas;
Assim, amigos meus, eu vou sobre um tesouro,
Sobre o estreito caixão, pequenino, infantil,
Da nossa mocidade, — a cotovia d'ouro
Que nasceu e morreu numa manhã d'Abril! —
Desprender, desfolhar estas canções sem nexo,
Estas pobres canções, tão simples, tão banais,
Mas onde existe ainda um pálido reflexo
Do tempo que passou, e que não volta mais.

Guerra Junqueiro, in 'A Musa em Férias'

7 comentários:

Regina Rozenbaum disse...

Manuel Amado
Que musa é essa hein? Deve ser algo indescritível a emoção de se saber inspiradora de uma poesia, letra de uma canção, pintura de uma tela, etc, etc. Será que um dia me torno uma MUSA? rsrs
Beijuuss n.c. e um ótimo FDS

www.toforatodentro.blogspot.com

Essência e Palavras disse...

Encantador.
Sua senbilidade de escolha emociona.

beeejo e bom finalzinho de tarde!

Graça Pereira disse...

Que saudades do tempo que passou e não volta mais...não pela juventude perdida mas pelos companheiros de jornada que dobraram a curva da vida e me deixaram tão só.
Beijo
Graça

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Manuel
Lindo poema, uma escolha muito boa, retrata a noss vida até ao fim.
Lindo

Beijinhos
Sonhadora

b disse...

O bom de ser musa é que estão sempre em férias.
De encantamento a sua postagem!

Glorinha L de Lion disse...

Ui que triste...hoje estou de bom humor, nada me abalará...afinal hoje é sábado, o dia é lindo, faz sol e não está calor...amo e sou amada...simples assim.
beijinhos.

Clecilene Carvalho disse...

Por isso é tão importante viver bem a vida e valorizar todos os momentos bons.

Otima escolha!