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quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Canção da Saudade .




Se eu fosse cego amava toda a gente.

Não é por ti que dormes em meus braços que sinto amor. Eu amo a minha irmã gemea que nasceu sem vida, e amo-a a fantazia-la viva na minha edade.

Tu, meu amor, que nome é o teu? Dize onde vives, dize onde móras, dize se vives ou se já nasceste.

Eu amo aquella mão branca dependurada da amurada da galé que partia em busca de outras galés perdidas em mares longissimos.

Eu amo um sorriso que julgo ter visto em luz do fim-do-dia por entre as gentes apressadas.

Eu amo aquellas mulheres formosas que indiferentes passaram a meu lado e nunca mais os meus olhos pararam nelas.

Eu amo os cemiterios - as lágens são espessas vidraças transparentes, e eu vejo deitadas em leitos florídos virgens núas, mulheres bellas rindo-se para mim.

Eu amo a noite, porque na luz fugida as silhuetas indecisas das mulheres são como as silhuetas indecisas das mulheres que vivem em meus sonhos. Eu amo a lua do lado que eu nunca vi.

Se eu fosse cego amava toda a gente.

Almada Negreiros, in 'Frisos - Revista Orpheu nº1'

5 comentários:

r disse...

"Este «berlogue» acerta em cheio", o Almada
é que
de cego, nada tinha.

Carmem Dalmazo disse...

Manuel...

Obrigada pelo abraço de saudade...vejo que também anda as voltas com ela..."A saudade"!...
As vezes dói né?...

Beijo...de saudade também!

Cris França disse...

maravilhoso esse poema, me encheu a alma...ah saudade , quem não a tem não é mesmo? eu? eu já nasci com saudade, por isso eu chorava tanto na maternidade , assim dizia minha mãe....rs bjs

angela disse...

Manuel
Lindo poema que ama o que não conhece e que só imagina.
beijos

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.